

Abuelas de Plaza de Mayo, premiada por Promoção da Paz
UNESCO - Paris, 14 de setembro de 2011
UNESCO - Paris, 14 de setembro de 2011
Transcrição do Discurso de Estela de Carlotto, Presidente da Associação, em Paris
Veja vídeo
Chefes de Estado e de Governo.
Senhores Ministros.
Excelências.
Senhoras e Senhores.
Senhores membros do júri.
Sr. Traoré, coordenador do prêmio.
Senhora Diretora-Geral da UNESCO, Irina Bokova.
Senhora Presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner.
Senhoras e Senhores.
Em nome da Associação "Abuelas de Plaza de Mayo", da qual sou presidente, desejo expressar grande emoção e gratidão que nos invade, ter sido selecionadas pela UNESCO com o Prêmio da Promoção da Paz Houphoüel-Felix Boigny, alta referência que reconhece nosso trabalho em favor dos Direitos Humanos, pela paz, contra a opressão, a injustiça e a impunidade.
A própria palavra avó desperta ternura e a imagem de uma velha de cabelos brancos, penteados com coque, óculos caídos no nariz, abraçando um neto a quem, certamente, contar-lhe-á histórias incríveis da sua vida. É claro, sentada em uma confortável cadeira de balanço.
Mas essa imagem é a antítese do que nós somos as "Abuelas de Plaza de Mayo", não estamos sentadas. A cadeira de balanço está tão vazia quanto os braços que deveriam abraçar o neto. E há uma explicação a isso, já que estamos em constante viagem pelo mundo em busca do filho ou filha, e do netinho que nos despojou uma ditadura civil-militar, que como tantas tomou o poder governamental espalhando o medo, a morte dos seus adversários e o sequestro de bebês, em sua a maioria nascidos durante o cativeiro de suas mães.
Nasce então uma luta coletiva de mães, avós e familiares que, desafiando os medos, enfrenta o governo ilícito e exige o regresso de seu entes queridos e o retorno da liberdade democrática, guiadas pelo amor, toda nossa trajetória ajudou a evitar o esquecimento e a impunidade. Com sentimentos pacíficos mas com implacável convicção para buscar verdade e justiça, construímos a Associação sem pensar que seria uma missão para sempre.
Chamam-nos abridoras de caminhos porque, nesta permanente busca, criamos mecanismos para que essa história não se repita em nenhum lugar do mundo. Assim, nasce de um Banco Nacional de Dados Genéticos, único no planeta que nos garante fidelidade do vínculo com o neto procurado. Produzimos avanços na jurisprudência e na psicologia, além de sermos porta-vozes da consciência social.
Essa ação nos tem premiado com o encontro de 105 netos apropriados, em sua maioria pelos depredadores. Mais 400 ainda estão desaparecidos. Devolver-lhes a identidade e seus direitos violados, os fará livres para recuperar sua história pessoal.
Hoje, acompanham-nos alguns deles e nos comove ver que, apesar de sua triste história, sonham e constróem a democracia.
Estamos transitando pela etapa democrática mais extensa da nossa história. Desde 1983, regem-nos governos eleitos pelo voto popular, mas de 2003 à presente data, as políticas estatais têm mostrado a decisão de chegar à verdade, à justiça e à memória que o país precisa. Em paz, em solidariedade, em respeito ao próximo, consolidando a democracia.
Isto foi recentemente reconhecido pela UNESCO, ao instalar na Argentina seu primeiro Centro no mundo para a formação dos Direitos Humanos, espaço que funcionará em um prédio resgatado do horror, da tirania, transformado-o em Espaço de Memória.
Nesse prédio, ex-Escola de Mecânica Naval, temos um edifício chamado "Casa pela Identidade 'Abuelas de Plaza de Mayo'", e, assim como outros dedicados aos Direitos Humanos, estará protegido e salvaguardado pelo UNESCO como bem da humanidade e da Cultura.
Já se passaram 34 anos de duro e doloroso caminho. As "Abuelas" temos acrescentado rugas em nosso rosto, cabelos grisalhos, andamos mais devagar, mas o coração bate com incrível vigor, fortalecido pela obstinação, pelo desafio, pela perseverança, pela fé, pelo otimismo e amor pelo que fazemos.
E há um compromisso com a vida, o de não abandonar esta luta porquecom ela segue o orgulho pela prole, a integração da família, a advertência que esta desapropriação não poderá se repetir em nenhum lugar do mundo, porque ali se levantarão as mulheres que, como nós, se tornarão em leoas para defender o filhote do cachorro. E se saberá que existem lutas em paz para que NUNCA MAIS seja possível que tal desapropriação.
Não somos heroínas nem diferentes, somos apenas mulheres-mães-avós.
Muito obrigada.
História das Avós


As crianças roubadas como "despojos de guerra", foram registrados como filhos próprios por membros das forças de repressão, deixados em qualquer lugar, vendidos ou abandonados em instituições como seres sem nome (SN). Dessa forma, fizeram-lhes desaparecer ao cancelar sua identidade, privando-os de viver com sua família legítima, de todos os seus direitos e liberdade.

Nada nem ninguém nos deteve em buscar os filhos dos nossos filhos. Tarefas detetivescas se alternavam com visitas diárias aos Tribunais de Menores, orfanatos, casas de família, enquanto investigávamos as adoções da época. Também recebíamos - e continuamos recebendo - as denúncias que o povo argentino nos fazem chegar, como forma de colaborar na tarefa de localizar as crianças. Este é o resultado do nosso trabalho de conscientização da comunidade.

Para seu trabalho, a Associação conta com equipes técnicas compostas por profissionais da jurídico, médico, psicológico e genético.
Cada uma das crianças tem um processo aberto na Justiça, ao qual se agregam as denúncias que são recebidas com o passar do tempo, conformando-se em elementos comprovatórios que determinam sua verdadeira identidade, e a dos responsáveis por seu sequestro e porte ilegal.
A fim de garantir no futuro a validade dos exames de sangue, temos implementado um banco de dados genéticos criado pela Lei Nacional n º 23.511, contendo os mapas genéticos de todas as famílias que têm crianças desaparecidas.
Trabalhamos pelos nossos netos - agora homens e mulheres - por nossos netos - que também veem violado seu direito à identidade - e por todas as crianças das gerações futuras, para preservar suas raízes e sua história, pilares fundamentais

O Amoroso Abrigo da Verdade: Nova Neta Restituída na Argentina, a 126ª
A jovem apresentou-se a Abuelas. No último dia 5 pôde conhecer a verdade sobre sua origem, e abraçar a família
8 de dezembro de 2017
Fonte: Abuelas de Plaza de Mayo. Autor: Abuelas de Plaza de Mayo
Tradução de Edu Montesanti
As Avós da Praça de Maio anunciamos, com grande felicidade o encontro da neta nova, filha de Violeta Graciela Ortolani e Edgardo Roberto Garnier, nascida em janeiro de 1977 durante o cativeiro da mãe. Ela poderá conhecer a avó paterna, Blanca Díaz de Garnier, que mora em Concepción do Uruguai, onde nasceu seu pai e poderá conversar com seus parentes paternos e maternos, com os companheiros de militância dos pais que já a estão acompanhando para abraçá-la na verdade
Os Pais
Violeta nasceu na cidade de Buenos Aires em 11 de outubro de 1953. Aos três anos de idade, sua mãe morreu de maneira que foi criada por uma tia em Bolívar. Ela era uma ótima companheira, sensível, alegre. Gostava muito de matemática e era apaixonada por pesquisa espacial. Ela também gostava de futebol. Era católica praticante. Não era de sair nem de dançar. Era falante e vivaz. Foi estudar Engenharia Química em La Plata, tendo conseguido uma bolsa de estudos. Ela também trabalhou como empregada no Hospital de Crianças. Iniciou a militância política na faculdade, onde conheceu Edgardo.
Edgardo nasceu em 7 de agosto de 1955 em Concepción do Uruguai, província de Entre Ríos. Ainda criança, era muito engenhosa: desmontou e montar de novo sua primeira bicicleta. Foi à escola N° 1 Nicolás Avellaneda, e era uma excelente aluna. Lia história em quadrinhos e preferia matérias humanas. Era torcedora do Independiente. Era muito interessada em tudo que se relacionava à conquista do espaço. Era ajuizado e silencioso. Mudou-se à cidade de La Plata para estudar Engenharia Eletromecânica.
O casal militou na FAEP, e Edgardo também militou no JP e Violeta no JUP. Desta maneira, ambos eram parte de Montoneros. Seus colegas de classe a chamavam de "La Viole" e, ele, "La Vieja Bordolino" ou "El Viejo".
Durante seus estudos e militância, Edgardo e Violeta moraram em Ensenada, na mesma casa de outros estudantes de Engenharia, entre eles Marita Aiub e Rafael Caielli, que também desapareceram com o filho, a quem ainda procuramos.
Naquela casa, eles montaram uma oficina elétrica chamada "El pollo eléctrico". E na parte de trás, mantinham um jardim.
Violeta e Edgardo casaram-se em 7 de agosto de 1976 em uma cerimônia religiosa simples , realizada em Bolívar. Ela estava grávida de três meses. O casal pensou em dar ao bebê o nome de Vanessa, se fosse menina; Marcos ou Enrique, se fosse menino.
Violeta foi sequestrada em 14 de dezembro de 1976 no bairro La Granja da cidade de La Plata, grávida de oito meses. Desde então, Edgardo procurou a esposa por céu e terra e depois retornou ao seu povoado em Entre Rios. Próximo à data provável do parto, ele a procurou novamente. Despediu-se dizendo que iria procurar pelo filho e, pouco depois, em 8 de fevereiro de 1977 em La Plata, ele também foi sequestrado.
Desde então, sua família deu continuidade à busca e foi uma das primeiras a fazer o denúncia nas Avós da Praça de Maio. Mas nenhuma informação confiável e concreta foi obtida sobre o casal, nem sobre a menina ou o menino que deve ter nascido em cativeiro. Até agora.
A Busca
Assim como em muitos dos últimos casos, uma jovem aproximou-se da Área de Apresentação Espontânea de Avós da Praza de Maio após alguém de seu meio ter-lhe confessado que ela não era filha biológica daqueles que a haviam criado. Até então, ela não tinha dúvidas sobre sua identidade.
Sua falsa Certidão de Nascimento foi assinado pela médica Juana Franicevich, quem já havia atestado a Certidão de Nascimento de três netos recentemente restituídos.
Na Área de Apresentação Espontânea, ela foi atendida e posteriormente encaminhada à Comissão Nacional de Direito à Identidade (CONADI) a fim de fornecer a informação documental e, posteriormente, realizar a análise no Banco Nacional de Dados Genéticos.
No último dia 5, essa jovem soube que era filha de Violeta e Edgardo. Ela recebeu a notícia no CONADI com grande felicidade, e concordou imediatamente em aproximar-se das Avós para conhecer sua família e os colegas dos seus pais, com quem ela já pode fazer brincadeiras e abraçar.
Esses encontros enchem-nos de esperança, e dão-nos força para redobrar a procura.
Inteire-se de outros netos restituídos, e notícias em português de Abuelas de Plaza de Mayo
Este caso, mais uma vez, demonstra a importância de que quem tem alguma informação sobre um possível filho de desaparecidos, falem com ele ou com ela, ou nos tragam essa informação. Longe de causar-lhes danos, os ajudarão a viver na liberdade que só a verdade pode oferecer.
Poucas avós vamos restando com o passa dos anos; alguns dias atrás tivemos a tristeza de despedirmo-nos de duas grandes companheiras, Raquel e Marta, que não conseguiram alcançar o tão esperado encontro.
Com a urgência do tempo que corre, estamos novamente convocando a sociedade a fim de nos ajudar nesta procua que já leva 40 anos.
E, a nossos netos e netas, reafirmamos que aqui só lhes espera o amoroso abrigo da verdade. Bem-vinda, neta 126!
"A democracia deve ser defendida com unhas e dentes", afirmou Estela de Carlotto na ex-Esma
Presidenta da Associação Abuelas de Plaza de Mayo, Estela de Carlotto, pontuou que "a democracia deve ser defendida com unhas e dentes", durante cerimônia que inaugurou a Casa da Identidade a ser administrada por este organismo de direitos humanos; funcionará no prédio da ex-Esma [Escola Superior de Mecânica da Armada, onde se praticava, ocultamente, torturas e assassinatos].
25 de maço de 2014
"Não vão nos deter. Seguiremos lutando pelos sonhos dos nossos filhos e pela recuperação dos nossos netos. Transformar esses lugares como a Esma, cheios de horror, é uma conquista que alcançamos com a valentia e a decisão de Néstor Kirchner", pontuou Carlotto no ato, que celebrou coincidindo com o 38º aniversário do golpe cívico-militar de 1976.
Por sua parte, o ministro de Justiça do País, Julio Alak, afirmou que quando se determinam, "os povos transformam a dor em esperança".
"Aqui estamos, celebrando a vida e o futuro em um lugar que foi emblema do terrorismo de Estado. Por isso, temos que cumprir o mandato que nos deu Cristina, de seguir adiante com os processos de lesa humanidade", apontou o funcionário.
No ato na ex-Esma, estiveram presentes também o secretário de Segurança, Sergio Berni; o secretário de Legal e Técnica, Carlos Zanini; e os deputados nacionais, Juliana Di Tullio e Horacio Pietragalla, entre outros.
Também fizeram parte desta comemoração o secretário-geral do grupo KOLINA, Andrés La Blunda; a neta recuperada Victoria Montenegro, e o ex-chefe de Gabinete, Juan Manuel Abal Medina.
Por sua parte, o ministro de Defesa, Agustín Rossi, destacou a presencia do Estado na lembrança das vítimas do terrorismo de Estado.
"Nos anos 90, não havia marchas tão numerosas como esta. E as que se produziam, eram realizadas no marco da resistência. Mas desde 2003, em 24 de março se converteu em feriado no marco de uma política de direitos humanos", ressaltou Rossi.
Enquanto isso, o secretário de Direitos Humanos do País, Martín Fresneda, observou que "o único reencontro dos argentinos deve se dar no marco da memória, verdade e justiça".
"Hoje li alguns editoriais, e na verdade me preocupei. Quem somos os que integramos os organismos e que militamos, sempre soubemos que queríamos justiça em vez de vergonha", afirmou.
E acrescentou: "Depois de 11 anos de kirchnerismo, hoje os argentinos podemos dizer que temos mais direitos e vivemos em um país mais justo".
Neste sentido, o deputado nacional e neto recuperado, Juan Cabandié, revindicou a luta dos organismos de direitos humanos, e destacou a recuperação do prédio onde funcionou a Esma como "um marco histórico na busca pela identidade".
Por último, a referente de Madres de Plaza de Mayo Línea Fundadora, Taty Almeida, ponderou o fato de que em um lugar onde houve um centro clandestino de detenção "celebre-se a vida".
"Há uma década, conduzidos por Néstor (Kirchner) chegamos a este lugar para recordar a luta de nossos filhos. Devemos isso à luta do primeiro presidente que fez dos direitos humanos a política de Estado", pontuou.
Por sua vez, o secretário de Legal e Técnica da Presidência, Carlos Zanini, encerrou o ato afirmando que "se os partidos políticos levantarem a bandeira dos direitos humanos, este será o verdadeiro triunfo de Néstor Kirchner sobre essa luta".
"Que seja bem-vinda a disputa pela bandeira dos direitos humanos, que é o centro do nosso ativismo. O verdadeiro triunfo de Néstor será concretizado se os partidos políticos levantarem essa bandeira para que esta batalha não termine aqui".
Como parte da comemoração dos 38 anos da instalação do terrorismo de Estado na Argentina, foram sinalizados três pilares na avenida Libertador.
O ato de Memória, Verdade e Justiça foi acompanhada, no prédio da ex-ESMA, pelos ritmos musicais que apresentaram o duo Coplanacu, Los Pericos e a Bersuit.